A Polícia Federal prendeu na noite desta terça-feira (16), em flagrante, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ). O parlamentar divulgou um vídeo no qual faz apologia ao AI-5, instrumento de repressão mais duro da ditadura militar, e defende o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF), o que é inconstitucional.No vídeo, Silveira ataca seis ministros do Supremo: Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli.
A prisão foi determinada pelo ministro Alexandre de Moraes. O deputado foi detido no fim da noite em Petrópolis, na Região Serrana do Rio, confirmaram fontes da PF à TV Globo.
Na decisão, Moraes definiu que o mandado deveria ser cumprido “imediatamente e independentemente de horário por tratar-se de prisão em flagrante delito”.
O ministro determinou que o YouTube retire o vídeo do ar, sob pena de multa diária de R$ 100 mil, e ordenou que a polícia armazene cópia do material. A decisão deve ser analisada pelo plenário do STF na sessão desta quarta.
Mesmo em flagrante e por crime inafiançável, a prisão de um deputado federal precisa passar pelo crivo da Câmara. Na decisão, Moraes diz que o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), deve ser “imediatamente oficiado para as providências que entender cabíveis”.
A decisão de Moraes
Na decisão, Moraes afirma que o deputado tem conduta reiterada no crime e cita que Daniel Silveira está sendo investigado a pedido da PGR por ter se “associado com o intuito de modificar o regime vigente e o Estado de Direito, através de estruturas e financiamentos destinados à mobilização e incitação da população à subversão da ordem política e social, bem como criando animosidades entre as Forças Armadas e as instituições”.
Para o ministro, a reiteração dessas condutas por parte do parlamentar revela-se gravíssima, pois atentatório ao Estado Democrático de Direito brasileiro e suas Instituições republicanas.
“Imprescindível, portanto, medidas enérgicas para impedir a perpetuação da atuação criminosa de parlamentar visando lesar ou expor a perigo de lesão a independência dos Poderes instituídos e ao Estado Democrático de Direito”, afirmou Moraes.
“Não existirá um Estado democrático de direito, sem que haja Poderes de Estado, independentes e harmônicos entre si, bem como previsão de Direitos Fundamentais e instrumentos que possibilitem a fiscalização e a perpetuidade desses requisitos”, prossegue.
“A Constituição Federal não permite a propagação de ideias contrárias a ordem constitucional e ao Estado Democrático (CF, artigos 5o, XLIV; 34, III e IV), nem tampouco a realização de manifestações nas redes sociais visando o rompimento do Estado de Direito, com a extinção das cláusulas pétreas constitucionais – Separação de Poderes (CF, artigo 60, §4o), com a consequente, instalação do arbítrio”, escreveu o ministro.
Moraes afirma que a liberdade de expressão e o pluralismo de ideias são valores estruturantes do sistema democrático, mas que “são inconstitucionais as condutas e manifestações que tenham a nítida finalidade de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico, indispensável ao regime democrático; quanto aquelas que pretendam destruí-lo, juntamente com suas instituições republicanas; pregando a violência, o arbítrio, desrespeito à Separação de Poderes e aos direitos fundamentais”.
Na decisão, o ministro apontou que o flagrante está configurado porque há, “de maneira clara e evidente, a perpetuação dos delitos”.
“Relembre-se que, considera-se em flagrante delito aquele que está cometendo a ação penal, ou ainda acabou de cometê-la. Na presente hipótese, verifica-se que o parlamentar DANIEL SILVEIRA, ao postar e permitir a divulgação do referido vídeo, que repiso, permanece disponível nas redes sociais, encontra-se em infração permanente e consequentemente em flagrante delito, o que permite a consumação de sua prisão em flagrante”.
Moraes pontuou ainda que, como estão presentes os requisitos da prisão preventiva, não há possibilidade de fiança. Como estão configurados tanto o flagrante quanto a impossibilidade de fiança, concluiu o ministro que a situação do parlamentar se encaixa na previsão da Constituição de que parlamentares só podem ser presos em flagrante por crime inafiançável.
O ministro do STF classificou de ardorosa, desrespeitosa e vergonhosa a defesa defesa pelo deputado do AI-5.
“Não existirá um Estado democrático de direito, sem que haja Poderes de Estado, independentes e harmônicos entre si, bem como previsão de Direitos Fundamentais e instrumentos que possibilitem a fiscalização e a perpetuidade desses requisitos. Todos esses temas são de tal modo interligados, que a derrocada de um, fatalmente, acarretará a supressão dos demais, trazendo como consequência o nefasto manto do arbítrio e da ditadura, como ocorreu com a edição do AI-5, defendido ardorosa, desrespeitosa e vergonhosamente pelo parlamentar”.
O vídeo do deputado
No vídeo publicado, o deputado defende a conduta do general Eduardo Villas Boas, ex-comandante do Exército. Em 2018, na véspera do julgamento no Supremo de um habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Villas Boas afirmou em rede social que o Exército tinha “repúdio à impunidade”.
A declaração foi vista como pressão sobre os ministros do STF. Fachin era o relator do pedido de liberdade de Lula, rejeitado pelo plenário da Corte.
Em livro recém-lançado, o ex-comandante disse que, na época, a manifestação foi discutida com o alto comando do Exército antes de ser publicada.
Nesta segunda-feira, Fachin reagiu em nota dizendo ser “intolerável e inaceitável qualquer forma ou modo de pressão injurídica sobre o Poder Judiciário. A declaração de tal intuito, se confirmado, é gravíssima e atenta contra a ordem constitucional. E ao Supremo Tribunal Federal compete a guarda da Constituição”.
Daniel Silveira está no primeiro mandato como deputado federal. Eleito em 2018, o ex-policial militar ficou conhecido por aparecer em vídeo destruindo uma placa que homenageava a vereadora Marielle Franco, assassinada no Rio em março daquele mesmo ano.
O parlamentar é investigado no Supremo no inquérito que apura a organização e o financiamento dos atos antidemocráticos. Também é alvo de outro inquérito, que investiga ataques a ministros da corte e disseminação de notícias falsas.
No ano passado, ele foi alvo de busca e apreensão e teve seu sigilo bancário quebrado em desdobramento do inquérito que apura os atos que defendiam o fechamento do Congresso e do Supremo.
No pedido de investigação, a Procuradoria-Geral da República aponta que o deputado pregou o uso das Forças Armadas contra o Supremo e que há uma ligação dele com movimentos extremistas conservadores.
O vice-líder do PT na Câmara, deputado Rogério Correia, afirmou que entrará nesta semana com uma representação contra Daniel Silveira no Conselho de Ética da Casa devido às declarações.
Fonte: G1