Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) ficaram incomodados com a ida do presidente Jair Bolsonaro à corte nesta quinta-feira (7) com um grupo de empresários para pressionar pela reabertura da economia.

Integrantes do Supremo viram o gesto como interferência indevida do Palácio do Planalto no Poder Judiciário.

Em outra frente, nos últimos dias, a proximidade do presidente da corte, Dias Toffoli, com Bolsonaro passou a ser alvo de críticas no tribunal.

Nos bastidores, a principal irritação dos magistrados foi com a tentativa de Toffoli de buscar entendimentos com o governo enquanto um membro da corte, Alexandre de Moraes, era alvo de ataques do presidente por ter barrado a nomeação de Alexandre Ramagem para a direção-geral da Polícia Federal.

Na visão de alas distintas da corte, o gesto de Toffoli deixou o STF fragilizado num momento em que era necessário demonstrar força e teria aberto espaço, por exemplo, para atitudes de Bolsonaro, como a visita desta quinta.

Diante da insatisfação com os acenos ao Planalto em meio ao fogo cruzado entre os Poderes, Toffoli recuou e procurou endurecer o discurso contra o chefe do Executivo.

Mais de uma semana depois de Bolsonaro atacar Moraes, o presidente do STF resolveu dar uma resposta nesta quarta-feira. Além disso, três dias depois de militantes bolsonaristas agredirem jornalistas, no último dia 3, Toffoli saiu em defesa da imprensa e criticou o comportamento dos manifestantes.

A avaliação de integrantes do STF é de que a ida de Bolsonaro soou como uma tentativa de dividir responsabilidades com o Judiciário num cenário de piora na economia.

Para ministros, o Supremo não pode ser culpado por eventual recessão, uma vez que o papel do Judiciário não é de avaliar de antemão os gestos do presidente, mas julgar atos dele caso provocado.

De surpresa e fora da agenda das autoridades, Bolsonaro levou um grupo de empresários ao Supremo para relatar a Toffoli os impactos do isolamento social na iniciativa privada. O ministro da Economia, Paulo Guedes, estava na comitiva.

Um dos integrantes do grupo de empresários chegou a comparar a situação da indústria com os efeitos da Covid-19 na saúde ao dizer que haverá mortes de CNPJs (Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas).

O presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, criticou a frase. “A população não pode mais cair em provocações que opõem dois valores e colocam o brasileiro para brigar”, escreveu nas redes sociais.

“Raciocínios pobres, argumentos rasos, metáforas incabíveis. CNPJ na UTI? Já são mais de 8.000 CPFs perdidos, sem chance de recuperação! Não validemos este debate lunático”, afirmou.

Diante da visita, Toffoli adotou tom duro. O presidente do Supremo disse que cobrou coordenação do governo com os Poderes e os entes da federação. Ele disse que é necessário fazer um planejamento para a volta do funcionamento das indústrias.

“Talvez [seja necessário] um comitê de crise para, envolvendo a federação e os poderes, exatamente com o empresariado e trabalhadores, [tratar da] necessidade que temos de traduzir em realidade esse anseio, que é o anseio de trabalhar, produzir, manter a sociedade estruturada.”

Os discursos de Toffoli nos últimos dias, quando ressaltou que divergências não podem levar a “agressões ou ameaças ao STF”, foram lidas no Supremo como uma reação ao isolamento a que ele estava sendo submetido por se manter próximo de Bolsonaro.

Em conversas reservadas, ministros chegaram a dizer que Toffoli estava perdendo as condições de liderar o tribunal e que a relação com Bolsonaro havia passado do limite.

Na semana passada, Bolsonaro disse que Alexandre de Moraes só entrou na corte por ser amigo do ex-presidente Michel Temer.

Publicamente, ministros do STF e até mesmo Toffoli saíram em defesa do colega depois que Bolsonaro subiu o tom.

Mas incomodou uma ala da corte as informações de que o presidente do STF tentava costurar um meio-termo com Bolsonaro que pudesse derrubar a decisão de Moraes e eventualmente liberar a nomeação de Ramagem para o comando da PF.